terça-feira, 1 de maio de 2012

CORDEL DO TRABALHADOR


Acorda de madrugada 
Faz tão pouco que deitou 
Mal dormiu, nem descansou! 
A mulher está desmaiada 
Nem beijou a filharada 
Vai começar mais um dia 
Trabalhar sem garantia 
Batalhar sem esperança 
É assim desde criança 
Enfrenta dura porfia. 

Pra que serve honestidade 
Suor, vergonha na cara? 
Se o governo não pára 
De premiar a maldade 
E tratar com crueldade 
Quem vive de trabalhar 
Pra família sustentar? 
E quando bandido mata 
Os seus direitos acata 
É preferível roubar! 

Foi fruto da ignorância 
Não devia ter nascido 
Vai morrer sem ter vivido 
Analfabeto na infância 
Não escapa da ganância 
Do bandido de gravata 
Que assalta, rouba e mata. 
Com a lei sempre ao seu lado 
Tem direito, advogado. 
Enquanto lixo ele cata! 

Se emprego ele consegue 
O salário é vergonha 
O governo usa a ronha 
E sempre o pobre persegue 
Por mais que o povo entregue 
Renda, imposto, desconto... 
Nunca tem dinheiro pronto 
Para o mínimo aumentar 
A quem pode reclamar? 
Só lhe resta marcar ponto 

Chega ao trampo cansado 
Depois de longa viagem 
Com medo da bandidagem 
Nem conseguiu vir sentado 
Pois o transporte aprovado 
Não serve nem pr’animal 
Não é transporte, é curral. 
Com fome, pois não comeu. 
O magro soldo não deu 
Às vezes até passa mal 

O dia todo malhando 
O patrão fica mais rico 
Pra ele não sobra um tico 
Na sua sorte pensando 
Os olhos só marejando 
Se ao menos os meninos 
Ainda tão pequeninos 
Pudessem um dia escapar 
Ir pra escola estudar 
Dava até pr’agüentar 

Mas o diabo da escola 
Fica tão longe de casa 
A dor no peito arrasa 
Só se for pedir esmola 
Nem a vitória consola 
Do time do coração 
O seu querido Mengão 
Ou se for Corintiano 
Alegria de baiano 
Não tira a tristeza não 

É preciso dar um jeito 
Dar livro para os meninos 
Por tênis nos pés tão finos 
Pra que eles tenham respeito 
Como gente de direito 
Arranjar logo uma vaga 
Na escola que num paga 
E creche para o menor 
Só de pensar sente dor 
Ó que miséria amarga! 

Já chegou o meio dia 
Tira a marmita escondido 
É só arroz mal cozido 
Batata sem melhoria 
Pos a pobre da Maria 
Não conseguiu melhorar 
O dinheiro ia faltar 
Pro almoço dos meninos 
Aqueles gambitos finos 
Que vontade de chorar! 

E no rádio ele escuta 
A notícia do momento 
O grande acontecimento 
Banqueiro filho da puta 
Com seus colegas desfruta 
Mais uma grande isenção 
Recebe desta nação 
Dos seus assaltos perdão 
Por roubar mais de milhão 
Não agüenta mais não! 

Se não fosse a família 
Que tem para sustentar 
E os filhos pr’encarar 
Procurava a quadrilha 
Do crime ia pra trilha 
Pois bandido tem direito 
É tratado com respeito 
Enquanto o trabalhador 
Só passa fome e dor 
Este país não tem jeito! 

JF 
Zéferro 

Um comentário:

Anônimo disse...

Sempre considerei a literatura de cordel uma belíssima manifestação da cultura popular, e este está magnífico, além de pontual, é claro !

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