sábado, 6 de fevereiro de 2010

JUSTIÇA QUAL O SEU PREÇO ?

No Brasil, existe a “Justiça” e a Justiça. Existe o poder e tudo o que está implícito quando ele é invocado. Pode soar como coletivo majestático ou pejorativo.


A Justiça sem aspas é igual para todos. Com aspas, vê mais igualdade em alguns do que em outros. Sem aspas, A Justiça é cega. Com aspas, exibe um olfato invejável.

A Justiça sem aspas assegura direitos iguais para todos. Com aspas, impõem mais deveres a alguns do que aos outros. Sem aspas a Justiça busca o restabelecimento da verdade. Com aspas, empresta legalidade à mentira.

Nos últimos anos, ao mesmo tempo em que a Justiça tornou-se mais acessível, a “Justiça” foi virando algo vago, impalpável.

Hoje, a Justiça é busca da justa reparação, mas a “Justiça” também é encontro com injustiças irreparáveis.

A Justiça é perspectiva de punição, mas a “Justiça” também é solidificação da impunidade.

A Justiça é a que tarda, mas não falha, mas a “Justiça” também é aquela que não chega e deixa prescrever.

A Justiça é justiça extrema, mas a “Justiça” também é extrema injustiça.

Sabe-se que, no Brasil, o defensor dos direitos humanos é um reacionário que ainda não foi assaltado. Sabe-se que o político progressista é um conservador que ainda não chegou ao poder.

Pois descobre-se agora que o juiz, o desembargador e o ministro do tribunal superior pode ser o incorruptível que ainda não foi submetido à sedução de um bicheiro ou ao flerte de um bingueiro.

Súbito, a Justiça vê-se compelida a expedir mandados de prisão para recolher a “Justiça” ao xilindró. A Justiça concede autorização para que os telefones da “Justiça” sejam grampeados.

A Justiça ordena à polícia que faça operações de busca e apreensão nos gabinetes e nas casas da “Justiça.” A Justiça bloqueia os bens da “Justiça”.

Quem observa a cena à distância fica confuso. A perspectiva de uma definição desse emaranhado que se convencionou chamar de Justiça –ou de “Justiça”— é cada vez mais remota.

Chegou-se a um ponto sem volta. Ou a Justiça acaba com as aspas, punindo exemplarmente eventuais malfeitores da “Justiça”, ou as aspas acabarão com o que resta dela.


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